Os dados indicam que o Brasil d@s pret@s é bem pior que o Brasil da turma da Escandinávia

Por Julio Menezes Silva.

Não é de hoje que as diferentes correntes do movimento negro e aliados ficam atentos à questão dos dados e estudos divulgados pelas autoridades, pressionando-os por fazer o chamado recorte racial, na coleta e análises das informações. No caso da Saúde, desde 2017 o Brasil conta com uma portaria do Ministério da Saúde que determina que a informação sobre raça/cor deve estar em todos os instrumentos de coleta de dados utilizados pelos serviços públicos e nas pesquisas em saúde no SUS (Sistema Único de Saúde), informa Cida Bento em sua coluna no jornal Folha de S. Paulo, de 15 de abril de 2020. O texto pode ser lido também no portal do Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades, organização da qual Cida Bento é diretora-executiva.

“Dessa forma, não faz sentido que a variável raça/cor não esteja em todos os formulários e sistemas de informação sobre a Covid-19, nos relatórios do Ministério da Saúde” afirma. Cida faz menção ao fato de que a área da Saúde, o Ministério da Saúde está negligenciando protocolos básicos de atendimento à população brasileira. Ainda em seu artigo, ela recorda “a informação sobre raça/cor constava já no primeiro recenseamento vernáculo no Brasil, ocorrido em 1872, há 148 anos, e hoje ela contempla as populações branca, parda, preta, indígena e amarela”.

Na nova edição de O Genocídio do Negro Brasileiro, livro clássico do pensamento social brasileiro, do professor Abdias Nascimento, uma pesquisa apresentada chama atenção. Até a década de 1970, diga-se, havia uma ideia estabelecida de que nessas terras tupiniquins havia uma democracia racial. Era aquela velha balela da meritocracia, dos direitos e oportunidades iguais sustentada pelos racistas intelectuais. No início da década de 1980, o economista Marcelo Paixão partiu do conceito e metodologia utilizados pela Organização das Nações Unidas (ONU) na definição do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), uma síntese de indicadores sociais como renda, educação, saúde, habitação e expectativa de vida.

Com base nos dados do IBGE, o economista calculou o IDH diferenciado para as populações branca e afrodescescendente (esta definida como a soma das categorias oficiais de “preto” e “pardos”) e os comparou aos índices de outros países. Os resultados mostram que, enquanto o Brasil como nação estava no 79 lugar entre 174 países pesquisados, um hipotético Brasil composto de afrodescendentes ficaria em 108, 29 posições abaixo do Brasil e sete abaixo da África do Sul. A população branca, entretanto, se classificaria em 49 lugar, 30 posições acima do Brasil.

São muitos os esforços dos movimentos negros, aliados antirracistas e sociedade civil para deixar ainda mais evidente o que vemos – e sentimos na pele – todos os dias nessa terra chamada Brasil: o racismo é descarado.  O Brasil dos pretos e pretas é bem pior do que o Brasil da turma da Escandinávia. Como então transformar esses dados, esse conhecimento e as informações duramente conquistadas, disponíveis, em política pública que atenda, definitivamente, os anseios de pelo menos 54% da população brasileira autodeclarada preta? Talvez a resposta a essa pergunta passe por articulação, organização e unidade coletiva, algo que esse Fórum Permanente pela Igualdade Racial (FOPIR) busca realizar a cada dia de sua existência.

Até a próxima!

Julio Menezes Silva é jornalista, artista em formação. Coordena a área de comunicação do Instituto de Pesquisas e Estudos Afro-Brasileiros (IPEAFRO) e integra o grupo de comunicação do Fórum Permanente Pela Igualdade Racial (FOPIR).