Conjunto de organizações nacionais da sociedade civil e Ordem dos Advogados do Brasil denunciam violência racial e de gênero no sistema prisional cearense a órgãos de direitos humanos da ONU

Um conjunto de movimentos e organizações da sociedade civil regionais e nacionais e a Ordem dos Advogados do Brasil apresentaram um relatório de sistematização de violações de Direitos Humanos no sistema penitenciário do Ceará no dia 20 de novembro que celebra o Dia Nacional da Consciência Negra, nas proximidades do Dia Internacional da Não Violência contra a Mulher e dentro da chamada Década Internacional dos Afrodescendentes da ONU (2015 – 2024) para denunciar como a violência do sistema prisional tem repercutido sobre a população jovem negra e feminina do Estado.
O escopo do relatório é apresentar o atual cenário do Sistema Penitenciário do estado do Ceará, que notadamente atinge com grande abrangência a população jovem negra e com uma forte intensidade a população negra feminina encarcerada e familiares de presos e egressos. A implementação de questionáveis procedimentos de segurança e disciplinares adotados no ano de 2019 pela recém criada Secretaria de Administração Penitenciária do Estado (SAP), estão distribuídas em sete dimensões fundamentais para a compreensão da gravidade e da extensão destas violações: i) perfil dos encarcerados cearenses e sobrerepresentação de afrodescendentes; ii)superlotação, condições estruturais e de assistência material a configurarem situação de tortura estrutural; iii) instituição de procedimentos disciplinares ilegais e que, de per si, representam práticas de tortura e de tratamento cruel, desumano e degradante; iv) falhas do controle externo por parte do Poder Judiciário e do Ministério Pùblico da execução penal no Estado; v) violação do direito à saúde no Sistema de Privação de Liberdade do Ceará vi) violações de direitos contra mulheres encarceradas e contra familiares de presos e egressos vii) ausência de transparência e criminalização de familiares, da advocacia criminal e de organizações de controle da sociedade civil.
A negação do Estado diante das inúmeras violações para com os direitos humanos da população negra, dá continuidade a séculos de violências quando essas pessoas foram sequestradas do continente africano e passaram a ser considerados, objeto, mercadoria e moeda, em que era tido como natural a prática das prisões em massa e torturas.
O Governo Estadual denomina esse conjunto de restrições e violências de DOUTRINA DO CONTATO ZERO, em que são adotadas diversos procedimentos a fim de evitar ou restringir o contato do preso com pessoas não encarceradas, sejam elas familiares, representantes da sociedade civil ou profissionais da administração penitenciária e disciplinar os presos pela humilhação, aniquilamento da subjetividade e torturas físicas e psicológicas.


O relatório também enfatiza o fato de que 94% das mulheres encarceradas no Ceará são negras que ocupam a única unidade feminina do Estado, em que se verificou uma superlotação insustentável para a gestão prisional de 393% a gerar imensas situações de violações de direitos humanos. Vale ressaltar que a unidade está passando por uma obra que visa expandir a capacidade, o triplicando o número de vagas do Instituto Penal Feminino o que consolidaria a situação de superlotação, calor e umidade configurando uma situação de tortura estrutural.
Além disso, são negras as mulheres que convivem com o cárcere, visitando e garantindo a subsistências de seus familiares e vivenciam cotidianamente estigmatizações, violências, criminalizações e ameaças.
Diante desse cenário, as organizações subscritoras solicitam que o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos, o Subcomitê de Prevenção à Tortura, o Comitê sobre a Eliminação da Discriminação Racial,o Comitê sobre Eliminação de todas as formas de Discriminação contra Mulheres reconheçam o cenário de grave violações de Direitos Humanos e realize visita in loco no sistema penitenciário cearense.

Leia documento na íntegra: Informe ONU prisional Ceará 2019.2